A mãe de todas as teorias da conspiração: a Terra-plana
Os membros da Sociedade Terra Plana (STP) alegam acreditar que a Terra é plana. Quando você caminha por aí, o planeta parece aplanado, e a sensação que você tem é que ele é plano.
Os membros daquela sociedade tomam toda a evidência contrária, como fotos da esfericidade da Terra feitas por satélites, como falsificações criadas por uma “conspiração da Terra redonda”, orquestrada pela Nasa e outras agências do governo.
Esta crença, de que a Terra é plana, tem sido descrita como a maior das teorias conspiratórias. Segundo seus líderes, o número de crentes tem crescido na base de 200 pessoas (a maioria americanos e britânicos) por ano, desde 2009.
E se a gente levar em conta a energia que eles dedicam em montar sua teoria no site, e as defesas que fazem de seus pontos de vista, eles parecem realmente, honestamente, acreditar que a Terra é plana.
Mas será que em pleno século 21 isto é sério? E se for, como é que isto pode ser psicologicamente possível?
O que exatamente eles acreditam
Ao mesmo tempo em que eles rejeitam baldes de evidência concreta de que a Terra é esférica, eles aceitam sem muito questionamento uma lista de afirmações que qualquer um chamaria de ridículas: a principal teoria deles afirma que a Terra é um disco com o círculo ártico no centro e a Antártida, um muro de gelo de 45 metros de altura, na borda.
Segundo eles, funcionários da Nasa guardam o muro de gelo para evitar que as pessoas subam o mesmo e caiam fora do disco.
O ciclo de dia e noite é explicado pelo posicionamento do sol e da lua que são esferas com 51 quilômetros que se movem em círculos de 4.828 km sobre o plano da terra (as estrelas estariam em um plano 4.988 km acima).
Como holofotes, estas esferas celestes iluminam diferentes partes do planeta em um ciclo de 24 horas. Além disso, haveria uma “antilua” que escureceria a lua durante eclipses lunares.
A gravidade, para eles, é uma ilusão. Os objetos não são acelerados para baixo, mas é o disco da Terra que acelera para cima a 9,8 m/s², movido por uma força misteriosa chamada energia escura.
Por enquanto, eles não chegaram a uma conclusão se a teoria da relatividade permite ou não que a Terra acelere para cima indefinidamente sem que o planeta eventualmente ultrapasse a velocidade da luz (aparentemente as leis de Einstein se mantém nesta versão de realidade alternativa).
E o que tem abaixo do disco da Terra? Eles não sabem, mas a maioria acredita que seja composto de “pedras”.
E há também a conspiração de que as fotos do globo são Photoshop, os aparelhos de GPS são fraudados para fazer os pilotos pensarem que estão voando em linha reta sobre uma esfera quando na verdade estão voando em círculos sobre um disco.
O motivo pelo qual o governo esconderia a verdade sobre a forma da Terra não está bem claro, mas eles acreditam que provavelmente é alguma coisa financeira.
Segundo o site, “logicamente custaria muito menos para falsificar um programa espacial do que ter um, e os conspiradores lucram a partir do financiamento que a Nasa e outras agências espaciais recebem do governo”.
E não é brincadeira
Os adeptos da teoria da Terra plana seguem um método de pensamento chamado “método Zetético”, uma alternativa ao método científico criado por um crente na Terra plana do século 19, segundo o qual as observações dos sentidos são inquestionáveis.
Segundo o Michael Wilmore, vice-presidente da STC, “o método coloca bastante ênfase na reconciliação do empirismo e racionalismo, fazendo deduções lógicas baseadas em dados empíricos”.
Na astronomia zetética, a percepção de que a Terra é plana leva à dedução de que ela realmente deve ser plana, e a antilua, a conspiração da Nasa e todo o resto são apenas racionalizações de como isto funciona na prática.
E eles levam isto a sério, considerando que este é um modelo de astronomia mais plausível que o encontrado em livros-texto.
Segundo Wilmore, enquanto alguns membros veem a sociedade e a teoria como um tipo de exercício epistemológico, seja como crítica ao método científico ou um tipo de “solipsismo para iniciantes”, há também os que apenas acham que a certidão de sócio fica engraçada na sala de estar. Mas muitos membros, sem dúvida, estão convencidos desta crença. O próprio Wilmore se diz um crente.
Estranhamente, tanto Wilmore quanto o presidente da sociedade, Daniel Shenton, acreditam que a evidência do aquecimento global é forte, apesar da maioria dela vir de dados de satélite obtidos pela Nasa, considerada o carro-chefe da conspiração da Terra redonda. Além disso, eles também aceitam a evolução e as principais teorias da ciência.
A psicologia da conspiração
Todas estas crenças absurdas não surpreendem os especialistas. Karen Douglas, psicóloga na Universidade de Kent, no Reino Unido, na qual estuda a psicologia das teorias conspiratórias, diz que as crenças deste grupo são coerentes com outros adeptos de teorias conspiratórias que ela já estudou.
Segundo a psicóloga, todas as teorias da conspiração compartilham a mesma estrutura: apresentam uma teoria alternativa sobre algum evento ou aspecto importante, e constroem uma explicação geralmente vaga do por que alguém está ocultando a “verdadeira” versão dos eventos. Quanto mais vaga a explicação, maior o apelo da teoria conspiratória.
Outro apelo destas teorias é dado pela forma com que os adeptos aderem à sua história. Por exemplo, os crentes da teoria da Terra plana geralmente são mais incisivos que a Terra é plana do que a maioria das pessoas sobre a Terra ser redonda (quando é que você achou que tinha que provar que a Terra é redonda?).
Além disso, o ponto de vista de uma minoria que seja apresentado de forma inteligente e que pareça bem informada, e quando os proponentes não se desviam de suas fortes opiniões, pode exercer bastante influência.
Em um estudo recente, os cientistas políticos Eric Oliver e Tom Wood, da Universidade de Chicago (EUA), descobriram que cerca de metade dos americanos acredita em pelo menos uma teoria conspiratória, como a de que o 11 de setembro foi um trabalho interno.
Há uma propensão a acreditar em muitas ideias que contradigam diretamente uma narrativa cultural dominante. Segundo Oliver, as crenças em conspirações nascem da tendência humana de perceber forças invisíveis atuando, conhecida como “pensamento mágico”.
Mas os crentes na Terra plana não se encaixam perfeitamente nesta imagem. A maior parte dos adeptos de teorias de conspiração adotam teorias marginais, e até mesmo contraditórias. Os adeptos da Terra plana só se prendem à forma da Terra.
Segundo o mesmo Oliver, se eles fossem os crentes comuns, eles teriam uma tendência para o pensamento mágico, como a crença em OVNIs, no demônio, ou em outras forças invisíveis.
Aparentemente não é este o caso deles, o que faz com que sejam bastante anormais em relação à maioria dos americanos que acredita em teorias conspiratórias.
Fonte: Hypescience